Uma inusitada situação

  
A agricultura apresenta aspectos às vezes tão interessantes quanto de razoável preocupação. Não é segredo para ninguém que o ano passado foi absolutamente atípico, impondo-nos um dos mais severos períodos secos das últimas décadas e, via de consequência, provocando, mercê das singulares condições climáticas, resultados danosos ao segmento produtivo rural. Lavouras perenes e pastagens foram as mais afetadas pela falta d água, o que acabou por reduzir significativamente as estimativas de produções nos cafezais, laranjais e canaviais, somente para citar alguns exemplos.

Muito embora não se possa deixar de registrar as perdas também nas lavouras de grãos, especialmente soja e milho, já que muitos produtores tiveram de replantar suas lavouras, mormente as de soja, assumindo grandes prejuízos com a nova semeadura.Tudo isto somado às já tradicionais dificuldades enfrentadas anualmente pelos agricultores, indica baixa de produtividade e consequentemente menores produções, o que vem afetar as receitas e a lucratividade dos produtores rurais.

Iniciado o novo ano, renovam-se as esperanças e a teimosia dos produtores em produzir parece florescer ainda com maior intensidade. Entretanto, janeiro foi um mês de pouquíssima chuva, o que refletiu negativamente em algumas plantações além das já citadas como, por exemplo, as de amendoim. Tanto que diversos produtores da leguminosa, reclamavam insistentemente, em conversas conosco, sobre o veranico e o sol implacável prejudicando a formação das respectivas lavouras.

Chega fevereiro e, com ele, algumas chuvas, trazendo melhoras ao humor de boa parte dos produtores, já esperançosos de obterem razoáveis colheitas. Passado o carnaval e o mais curto dos meses, ingressamos em março, certos de que, passado o prejudicial veranico e com as bem-vindas chuvas de fevereiro, o corrente mês seria o melhor período para as atividades de colheita do amendoim e finalização das de soja perene, ambas culturas em grande parte plantadas nas áreas de renovação de canaviais. E é nesta mesma época que o canavicultor, logo atrás das colheitadeiras dos grãos vai plantando suas lavouras de açúcar de 18 meses.É um ciclo de lavouras que termina para iniciar um outro de lavouras que germinam. Tudo em obediência a uma dinâmica agrícola cada vez mais presente e tecnificada.

Entretanto, não é que todas essas expectativas foram literalmente por água abaixo, como consequência das fartas chuvas que fecham o verão, deixando o sol por vários dias bem escondidinho entre as nuvens? Lavouras encharcadas não podem ser colhidas e, com as terras ocupadas com outras plantações, não se planta a cana de açúcar.
Interessante as atividades da agricultura: enquanto há menos de 60 dias reclamava-se pela insistente seca, hoje aguarda-se ansiosamente pela volta dos dias ensolarados que permitam os trabalhos de colheita dos grãos e, concomitantemente, os de plantio da cana de açúcar.

E é neste contexto, muitas vezes de sobressalto por condições climáticas ou por outras razões bem mais próximas, que vivem os produtores rurais. Portanto, se não houver principalmente vocação, que nos dá a perseverança e a forte motivação para continuarmos nas lides rurais, certamente não haverá argumento convincente para segurar o homem no campo, enfrentando as dificuldades inerentes a quem produz alimentos e, às vezes, a incompreensão dos que vivem de lá distantes.

Se nossos governantes prestassem um pouco mais de atenção às peculiaridades da agropecuária, provavelmente somariam forças com os produtores, estes incansáveis e teimosos agricultores e pecuaristas, na construção de uma infraestrutura própria e mais adequada e de uma logística muito mais presente e segura.

Inobstante, voltando à realidade do cotidiano, embora confiantes na capacidade e tenacidade dos produtores rurais, esperamos que os caminhos da economia da nação sejam menos tortuosos e mais justos e direcionados aos anseios da população brasileira.

*Joaquim Augusto Azevedo Souza presidente da Associação e do Sindicato Rural de Ribeirão Preto